Alienação fiduciária: posso perder meu imóvel em leilão extrajudicial? 

ALei nº 9.514/1997, que dispõe sobre a alienação fiduciária em garantia de bem imóvel, ainda gera muitas dúvidas quanto ao procedimento da execução extrajudicial.
Primeiramente, vamos debater a constitucionalidade da Lei e a incidência do Código de Defesa do Consumidor.

Discute-se se há violação da Constituição Federal, uma vez que permite a consolidação da propriedade em favor do fiduciário (por exemplo, Instituição Financeira, incorporadora etc) e a venda do bem em leilão extrajudicial, sem, portanto, a intervenção do Poder Judiciário.

Contudo, o Poder Judiciário já esgotou o tema e reconhece a constitucionalidade da referida Lei, assim, somente deverá ser acionado quando o procedimento instituído pela Lei nº 9.514/1997 não é observado.

Em 26/10/2023, o STF, no Recurso Extraordinário 860631, fixou a seguinte tese: “É constitucional o procedimento da Lei nº 9.514/1997 para a execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária em garantia, haja vista sua compatibilidade com as garantias processuais previstas na Constituição Federal“.

Portanto, é inócuo socorrer-se do judiciário a fim de atacar a constitucionalidade da execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária.

No que concerne à incidência das regras do Código de Defesa do Consumidor em contratos com garantia da alienação fiduciária, a celeuma gira em torno da rescisão antecipada do contrato, onde o adquirente/fiduciante não possui mais interesse na transação ou deixa de pagar as parcelas do financiamento e procura o Poder Judiciário para reaver as parcelas pagas, conforme as regras do Código de Defesa do Consumidor, mais benéficas ao adquirente/fiduciante.

Porém, o judiciário colocou uma pá de cal no assunto, com a decisão proveniente da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial 2.042.232, entendendo que, em casos de quebra do contrato, deve-se aplicar o rito definido na Lei nº 9.514/1997 e não incidência do Código de Defesa do Consumidor.

Ultrapassadas essas discussões, passo a discorrer acerca do procedimento da execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária.

Importante esclarecer que a Lei nº 9.514/1997 traz em seu bojo os procedimentos para consolidação da propriedade em nome do fiduciário, em caso de inadimplência do fiduciante (Arts. 26 e 26-A) e o procedimento para realização do leilão extrajudicial (Arts. 27 e 27-A).

Uma vez inadimplente, o fiduciante deverá ser intimado extrajudicialmente pelo fiduciário, por intermédio do oficial do registro de imóveis competente, para pagar a prestação vencida e as que vierem a vencer até a data do efetivo pagamento (purgação da mora), no prazo de 15 (quinze) dias.

O pagamento será acrescido de juros convencionais, as penalidades, encargos contratuais e legais, inclusive os tributos e contribuições condominiais, bem como as despesas de cobrança e de intimação.

Após a referida intimação, permanecendo o fiduciante inerte, consolida-se a propriedade ao fiduciário, sendo averbada no registro de imóveis, em até 30 dias após a expiração do prazo para o pagamento das parcelas vencidas e acréscimos (purgação da mora).

É de suma importância mencionar que, o fiduciante poderá PURGAR A MORA E ACRÉSCIMOS até a data da averbação da consolidação da propriedade, conforme o § 2º, art. 26-A, da Lei nº 9.514/1997, com nova redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023.

No mais, o art. 27, § 2º-B dispõe que, até a data do segundo leilão, o fiduciante terá direito de preferência para ADQUIRIR o imóvel pelo preço correspondente ao VALOR DA DÍVIDA E ACRÉSCIMOS CONTRATUAIS E LEGAIS.

Verifica-se que o prazo para a realização do leilão é de 60 dias, contudo, não há penalidade na inobservância do referido prazo.

Apesar da Lei nº 9.514/1997 ter sido alterada pela Lei 14.711, de 2023, permanece a obrigatoriedade da comunicação do leilão, local, data e hora, aos devedores, conforme o § 2º-A, art. 27:

Para fins do disposto nos §§ 1º e 2º deste artigo, as datas, os horários e os locais dos leilões serão comunicados ao devedor e, se for o caso, ao terceiro fiduciante, por meio de correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico.”

Por fim, o colendo Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo determinou que os leilões devem ser realizados no local da situação do imóvel, com exceção de previsão em contrário no contrato:

Registro de Imóveis – Alienação fiduciária em garantia – Ausência de prova da publicação do edital dos leilões no local da situação do imóvel – Leilão realizado em local diverso daquela em que situado o imóvel, sem previsão legal ou contratual – Registro inviável – Recurso não provido”

(Apelação nº 1007423-92.2017.6.26.0100, Rel. Des. Corregedor Geraldo Francisco Pinheiro Franco, j. 24/07/2018, DJe 14/08/2018).

Renato Ferraz Sampaio Savy é advogado Imobiliário e Condominial, mestre em Direitos Difusos e Coletivos e professor universitário. E-mail: contato@ferrazsampaio.adv.br – site: www.ferrazsampaio.adv.br

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